Maísa Marchetti Barbosa (UEL)
maisa.marchetti@yahoo.com.br
Prof.º Dr. César Augusto Carvalho (Orientador)
A educação no modelo Neoliberal
Para analisarmos o atual sistema educacional, no que tange o Ensino Médio, é preciso examinar a Reforma Educacional iniciada no governo Fernando Henrique Cardoso, período em que os acordos internacionais tornaram-se marca na suposta democratização dos acessos à saúde, à moradia, à educação. Era a abertura da economia à iniciativa privada, que substituía o Estado nas áreas na qual o mesmo é considerado ineficiente.
Entendíamos essa cruzada reformista, na qual se empenhava seriamente o governo de Fernando Henrique Cardoso como uma ação política estratégica para a aceleração das mudanças sociais necessárias à nação em face da matriz política, teórica e ideológica do projeto de governo de FHC, caracterizada centralmente, pela dependência ao capital internacional. (SILVA JÚNIOR, 2002, p.204).
Através desta racionalidade que tem como pressuposto a administração-eficiente, o governo de FHC criou o consenso em que democracia e desenvolvimento constituem a essência do discurso. É a transformação do Estado em um Estado gestor.
Essa reforma estrutural teve impactos na esfera educacional. No caso do Ensino Médio, a reforma foi tida como ação política para mudança social, em que os elementos fundantes para essas mudanças foram a economia e o trabalho. Logo, a Educação não é apenas o receptáculo desse consenso, mas também um reprodutor deste modelo.
A educação, esfera formativa do ser social, passa a expressar o novo paradigma político centrado no epistêmico e na busca do consenso, e toma a realidade social e natural como dada. Elas são, dessa forma e por alguma razão, de ordem metafísica e qualquer conflito deve ser superado num consenso produzido por intermédio da democracia comunicativa, sem questionamentos das contradições que produzem nossa realidade social por meio de relações sociais que se materializam em práticas sociais de qualquer tipo. (....).
A realidade social contraditória, histórica e produzida pela atividade humana é negada e é tomada como algo dado que justifica nossos valores, nossas crenças. (...)
Trata-se de um movimento teórico de adaptação às mudanças sociais, sem questionar as razões dessas transformações. (...)
O conhecimento orientado pela existência humana cede lugar à instrumentalização pelo social naturalizado por meio das convenções que orientam a existência humana. (SILVA JÚNIOR, 2002, p.211-212).
A juventude no contexto educacional
E é imerso nessa realidade educacional que está o jovem estudante do ensino médio, foco de nossa análise, porém essa juventude não é homogênea, e como tal é produto desta mesma sociedade, ou seja, é uma construção social.
Ao ser definida como categoria social, a juventude torna-se, ao mesmo tempo, uma representação sócio-cultural e uma situação social (novamente no sentido dado por Mannheim). Ou seja, a juventude é uma concepção, representação ou criação simbólica, fabricada pelos grupos sociais ou pelos próprios indivíduos tidos como jovens, para significar uma série de comportamentos e atitudes a ela atribuídos. Ao mesmo tempo, é uma situação vivida em comum por certos indivíduos. (GROPPO, 2000, p. 7-8).
Outro aspecto levantado pelo Luis Antonio Groppo (2000) é que a percepção de juventude também é diferentemente vivida com relação aos gêneros, mesmo quando estes estão em uma mesma classe social.
Outra marca da juventude está na construção de identidades, que se diferenciam de acordo com o estilo adotado por cada grupo. A Escola, neste caso é o aparelho do Estado que ajuda o jovem a se inserir na sociedade, como analisado por Eisenstadt, citado por Groppo (2000):
Eisenstadt diagnostica como problemática a passagem da infância a maturidade na modernidade, dadas as dificuldades que os grupos etários juvenis encontram para construírem funções sociais realmente integradas para os indivíduos jovens, em uma sociedade baseada em critérios universalistas, de desempenho e especialização. A escola, segundo Eisenstadt, foi criada para preparar o indivíduo em relação à grande especialização econômica e profissional da sociedade moderna. (GROPPO, 2000, p.43).
E estar inserido na sociedade, hoje, é estar inserido no Mercado de Trabalho. Pensando essa lógica, a LDB 9.394/96 sanciona na seção “Do Ensino Médio”, no artigo n.º 35
“II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade as novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores”.
A obrigatoriedade do Ensino de Sociologia
A disciplina Sociologia, no Ensino Médio, tem travado uma luta no interior da Instituição Educacional por um lugar maior. A obrigatoriedade nos currículos foi promulgada em 2007, abrindo mecanismos tanto para a luta de uma valorização da disciplina.
A Escola, a organização das atividades letivas, o espaço (tanto físico como intelectual) que o professor detém reflete esse momento da disciplina na Escola, ou seja, dessa luta por espaços iguais. E esse contexto reflete também nas percepções que os alunos têm tanto da disciplina como da Escola.
Florestan Fernandes (1977) em seu texto O Ensino da Sociologia na Escola Secundária Brasileira, já elegia o ensino de sociologia como uma das formas de divulgação dos conhecimentos sociológicos e para a formação de indivíduos mais capazes de integrar civicamente a sociedade, ou seja, indivíduos mais conscientes de seus direitos e deveres de cidadão.
O objeto da pesquisa
Este trabalho, portanto, é uma tentativa de verificar empiricamente, isto é na prática, na realidade, aquilo que compreendemos teoricamente: a educação, objeto de análise dos clássicos. Com essa experiência pudemos apreender o processo de Educação, o ensino de Sociologia e o significado disso para os estudantes do Ensino Médio.
A Educação, como uma Instituição, traz consigo as demandas do que se pretende e o que se tem como sociedade e realidade. O Ensino de Sociologia dentro desse processo é uma das ferramentas para desnaturalizar e estranhar aquilo que é oferecido para esses jovens como determinado, como natural.
Em uma observação pude analisar como os alunos percebem e atribuem importância ao espaço proporcionado pelas aulas de Sociologia para debaterem a realidade que os cerca. Acredito que é apenas o início de uma jornada, já que apesar de existir no Estado do Paraná por algum tempo o Ensino de Sociologia, a obrigatoriedade sancionada no ano passado traz novo fôlego, principalmente aos profissionais da área e para aqueles que serão os futuros profissionais.
As aulas de Sociologia
O Colégio Estadual José Aloísio Aragão ((Colégio de Aplicação da Universidade Estadual de Londrina) é uma escola privilegida se tomarmos o ensino de Sociologia como eixo, diferente de outros colégios estaduais. O Colégio de Aplicação possui o Ensino de Sociologia nos três anos do Ensino Médio, ou seja, desde o primeiro ano os alunos tomam contato com a disciplina.
O livro didático do Estado é apenas um dos materiais utilizados pela professor nas aulas que também utiliza recursos audiovisuais como filmes e músicas. E outra ferramenta se constitui nos debates, onde os alunos podem expressar suas opiniões sobre o tema e conteúdo das aulas.
Conhecendo os alunos do 1º ano do Ensino Médio-turma B
O primeiro ano do ensino médio, turma B, do Colégio Aplicação é composto, em média, de 35 a 40 alunos, equilibrada em número de meninas e meninos. Para apreender como eles assimilam o ensino de Sociologia realizei a observação participante, pois no período cumpri a observação das aulas e a prática da regência. Essa prática do exercício de lecionar nos aproxima dos alunos, intervindo de forma efetiva, no sentido do esforço de colocar próximo à realidade deles os temas e conteúdos da sociologia.
Outra ferramenta utilizada foi um questionário, no qual abordava os anseios dos alunos sobre as aulas de Sociologia; quais os temas que eles gostariam que as aulas tratassem, a opinião sobre a escola e se as aulas de sociologia os tornam pessoas mais conscientes.
A partir destes questionários, o que pude entender é que os alunos de um modo geral, gostam da disciplina e dos temas abordados, como podemos perceber na resposta de uma aluna: “Eu penso que as aulas de Sociologia são muito interessantes pois nos tiram da alienação e nos proporcionam 'criticar’ além da primeira impressão, ou seja, buscar raízes. Porém, alguns temas abordados em sala são inadequados (na minha opinião) a jovens da nossa faixa etária”. Quanto à opinião sobre a Escola, muito deles colocam que esta instituição é importante na preparação para a vida, mas precisa rever sua forma de atuação, foi o que pudemos perceber na resposta de um aluno sobre a escola: “Uma instituição atrasada que serve para nos manter na linha”. O que nos remete a Emile Durkheim, que coloca a Escola como a instituição fundamental para a formação de indivíduos mais harmônicos com a sociedade.
Sobre a última questão abordada no questionário, se as aulas de sociologia os fazem pessoas mais conscientes, os alunos responderam que sim, que as aulas de sociologia os auxiliam na formação crítica de um ser – como o explicitado na fala de uma aluna: A sociologia me ensinou a ser mais crítica, a ter uma visão mais ampla de tudo, não só ficar pensando sobre as coisas do ‘meu mundinho’.
Considerações finais
Este artigo é um esforço para a apreensão e compreensão de como se efetua o processo de aprendizagem, em especial da Sociologia pela juventude(s) de hoje.
Podemos perceber que os jovens anseiam por mudanças, as quais devem se dar no interior das Escolas. Na opinião deles, por sua vez, a Escola não acompanhou o advento da modernidade e as novas formas de comunicação, o que nos remete as considerações que Florestam Fernandes fazia ao ensino secundário no Brasil.
O ensino secundário é formativo por excelência; ele não deve visar a acumulação enciclopédica de conhecimentos, mas a formação do espírito dos que os recebem. Torna-se, assim, mais importante a maneira pela qual os conhecimentos são transmitidos, que o conteúdo da transmissão (FERNADES, 1977, p.110).
O que nos leva a mais uma reflexão: como o ensino de sociologia pode reverter este quadro? O que pudemos perceber, é que a utilização de outros meios, além do ‘quadro negro’ para a transmissão do conteúdo, aproximou os alunos da aula, ou seja, eles se envolviam mais no debate, pois querem que suas opiniões sobre a realidade que os cerca seja ouvida e compartilhada.
A sociologia neste caso os desperta para a realidade, como o colocado por Flavio Sarandy (REFERÊNCIA). A apropriação por parte dos alunos de um ‘modo de pensar’ através do contato com as diversas teorias e perspectivas sociológicas, proporcionaria a aprendizagem do modo de pensar. Um modo de pensar que pode ampliar a compreensão da historicidade do conhecimento, ou seja, o aluno, através de exercício proposto apreenderia a dinamicidade e complexidade da vida.
Referências
DURKHEIM, Emile. Educação e Sociologia. São Paulo: Melhoramentos; Rio de Janeiro: Fundação Nacional de Material Escolar, 1978;
FERNANDES, Florestan. A Sociologia no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1977;
GROPPO, L. A. Juventude: ensaios sobre sociologia e história das juventudes modernas. RJ:
DIFEL, 2000;
MALINOWSKI, Bronislaw Kasper. Argonautas do Pacífico ocidental: um relato do empreendimento da Nova Guiné melanésia. SP: Abril Cultural, 1978. (Os Pensadores);
NOSKIER, A. LDB: A Nova Lei da Educação. Curitiba: Secretária do Estado da Educação do Paraná. s/d;
SARANDY, Flávio Marcos Silva. Reflexões acerca do sentido da Sociologia no Ensino
Médio: desenvolver a perspectiva sociológica: objetivo fundamental da disciplina no Ensino Médio. Revista Espaço Academico (2001-2003): www.espacoacademico.com.br (acessado em 02/02/2007);
SILVA JÚNIOR, J. dos R.. Mudanças Estruturais no Capitalismo e a Política Educacional
do Governo FHC: O Caso do Ensino Médio. IN: Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n.º 80, setembro de 2002, P.203-234.
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